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MARCOLINO GOMES CANDAU

MARCOLINO GOMES CANDAU

Ministro da Saúde do Mundo

       Comecei a conhecer Marcolino Candau na Faculdade Fluminense de Medicina. Mais tarde, impressionou-me como permanecia desconhecido entre seus conterrâneos, tendo alcançado a mais alta função de Saúde, como diretor-geral da Organização Mundial de Saúde.

 

       O Rio, em 31 de maio de 1911, serviu de berço familiar para Marcolino Gomes Candau, para entregá-lo, ainda jovem, ao seu berço profissional, Niterói, onde começa seus estudos em 1928, na Faculdade Fluminense de Medicina.

 

       A lado de Vasco Barcellos, cria o Diretório Acadêmico Barros Terra. Entusiasma-se pela Saúde Pública ao identificar-se com o professor de Higiene, o sanitarista Manoel José Ferreira – querido mestre e amigo ao qual estaria vinculado por toda a vida. Diplomando-se em 18 de novembro de 1933, passa a professor assistente de Higiene. Faz o Curso de Saúde Pública na Escola Nacional de Saúde Pública.

 

       Nomeado médico do Estado do Rio, conhece de perto os problemas sanitários das cidades do interior. Assistente do diretor-geral de Saúde Pública, usa sua liderança para estimular colegas para o Sanitarismo. Pleiteia junto à Fundação Rockfeller no Brasil o curso de mestrado na renomada Escola de Saúde Pública da Universidade de John Hopkins, em Baltimore, Maryland (EUA). Antes de realizar o projeto, teve a missão de combater o Anophelis gambiae, em 1939, como médico dos Serviços de Malária do Nordeste.

 

       Ao retornar, chefia o Centro de Saúde de Niterói, onde se preparavam os novos sanitaristas. Em 1943-44 é designado diretor da Divisão de Educação Médica do Serviço Especial de Saúde Pública e em 1947, superintendente. Amplia as ações do órgão, iniciando programas de saúde na Amazônia e no Vale do Rio Doce.

 

       Em 1950, é convidado a ocupar o cargo de diretor da Divisão de Organização de Serviços de Saúde da OMS. Em 1951, vai ser diretor-geral assistente e, em 1952, vice-diretor da Organização Pan-Americana de Saúde.

 

       Em 1953, o diretor-geral da OMS, Dr. Brack Crisholm, decide afastar-se. Reúne-se, com a participação do inesquecível Maneco Ferreira, o Conselho Executivo da OMS, e Marcolino Candau é eleito diretor-geral, com um mandato de 5 anos – que seria renovado três vezes, por unanimidade.

 

       Ei-lo, aos 42 anos de idade, feito ministro da Saúde do mundo, a enriquecer suas origens, enobrecendo e dignificando a profissão, erguendo e mantendo, por duas décadas, a credibilidade no médico brasileiro.

 

       Deu novas dimensões à organização. Elevou o número de países membros de 48 para 153 (mais do que possuía a própria ONU). Fez editar a Revista Saúde no Mundo, contendo orientações para todos os povos. Enfrentou problemas técnicos e políticos com serenidade, imparcialidade e determinação. Construiu ampla e condigna sede – onde chegam e de onde saem as coordenadas mensagens dos avanços em todas as partes do mundo – equipada e inaugurada na sua administração (1966). No Jardim de Higéia, à entrada, roseiras de Barbacena, cactos nordestinos; entre os ornamentos, quadro de Iberê Camargo, madeira do Espírito Santo, pedras de Minas Gerais. O Brasil se faz presente na memória imorredoura de Marcolino Candau, que lá deixou as marcas do seu idealismo.

 

       Soube ultrapassar limites e fronteiras para levar os objetivos identificados com as necessidades do bem comum a todas as regiões, sem distinções de raça, credo, condição social, política ou ideologia. Imbatível portador dos ideais, foi pioneiro, desbravador, bandeirante da Saúde – admirado e respeitado pelas suas meritórias ações. Realizou a “Era Candau” na OMS, em 4 quinquênios de pleno sucesso. Nenhum outro dirigente alcançou tanto reconhecimento em organismos internacionais.

 

       Chegou a ser nomeado ministro da Saúde do Brasil, em 1962, e veio pessoalmente explicar as razões para declinar do convite: liderava várias frentes de luta contra graves doenças, como malária, poliomielite, tuberculose, influenza, tracoma, esquistossomose, febre hemorrágica, hanseníase e outras, além de comandar a construção da casa própria da OMS.

 

        Em 1972, encontramo-nos com Candau no Hotel Debret, em Copacabana. Relatou que estava coordenando os trabalhos de dois mil especialistas em cancerologia e que a Imunologia daria, em breve, respostas importantes na luta contra o câncer. Entusiasmava-se com a obtenção da vacina contra a poliomielite e a doação de Albert Sabin, a erradicação da bouba no Haiti e a estruturação do Congo Belga para programas integrais de Saúde. Sorridente, descrevia diferenças entre sua vida lá fora e aqui no Brasil, onde era um ilustre desconhecido. Presenciamos quando o ministro da Saúde, Rocha Lagoa, lhe ofereceu segurança em sua estada no Rio. No que ele respondeu: – “Para que? Ninguém aqui me conhece...”

 

       Afirmava, como um obstinado, que a varíola não mais haveria de existir no mundo – e conseguiu escrever a página de sua erradicação. Era recebido com honras de chefe de Estado em inúmeros países; isto, para ele, dizia, não significava tanto quanto estar em meio à sua gente, recordando instantes vividos do outro lado da baía (Niterói) e no Rio, faces de velhos amigos e companheiros que lhe davam saudade.

 

       Ao deixar o cargo, em 1973, foi escolhido por unanimidade pela XXVI Assembleia Mundial de Saúde para receber o título de Diretor-Geral Emérito da OMS. Foi conselheiro da Universidade das Nações Unidas de 1973 a 1974. Entre 1975-1979, exerceu o Magistério na Universidade de Michigan, como professor de Saúde Internacional.

 

       A Revista Médica Britânica (British Medical Journal) dedicou artigo às suas realizações:

 

Quando Candau chegou, a OMS era pequena. Ele a deixa como uma grande organização, da qual tem sido o principal arquiteto, merecidamente recebedor de honras de muitos. O monumento que deixa é uma organização internacionalmente reconhecida como efetivo instrumento a serviço das necessidades de saúde da humanidade.

 

       Sobre ele disse o ex-diretor-geral da OMS Hiroshi Nakajima (1998):

 

Muito do que a instituição é hoje e muito do modo como funciona se deve ao pensamento, conselho e liderança do Dr. Candau. Os sucessos da OMS – como a erradicação da varíola, a vindoura erradicação da pólio e da filariose, não seriam possíveis se uma sólida infraestrutura não tivesse sido construída por esta organização. Dr. Candau estabeleceu as bases para esta infraestrutura.

 

       Ocupou a presidência da Sociedade Brasileira de Higiene e Saúde Pública, tendo ao seu lado o mestre-parceiro Manoel Ferreira. Em dezembro de 1959, no XI Congresso da SOBRAHSP, a Associação dos Ex-Alunos da Faculdade Fluminense de Medicina promoveu uma homenagem a Candau, na sede da antiga Associação Médica Fluminense, na Praça da República, em Niterói. Há placa alusiva na atual sede da Casa do Médico. O Professor Manoel Ferreira fez-lhe emocionada saudação.

 

       Marcolino Candau foi casado com D. Ena de Carvalho, com quem teve dois filhos.

 

       Em 24 de janeiro de 1983, faleceu o mais laureado aluno da Faculdade de Medicina da UFF, o dignificador de mandatos, honrando o Brasil e se transformando no ministro de Saúde do mundo para servir à harmonia entre os povos, à felicidade das nações e à paz.

 

       Exercendo à época a prefeitura de Niterói, propusemos erguer um mausoléu em honra ao grande brasileiro. Seu filho Marcos Candau declinou, informando que o pai pedira para ser cremado – e que as cinzas fossem lançadas no Jardim de Higéia, em frente à sede da OMS.

 

       Tivemos oportunidade de visitar o belo edifício em 1987; conversamos com o então diretor-assistente, Dr. David Tejada de Rivero, e outros funcionários que externaram profundo respeito e admiração pelo diretor Candau. Seu escritório é conservado como um altar na Catedral de Saúde, onde pontifica como um Benfeitor da Humanidade.

 

       Niterói manifestou seu reconhecimento ao grande vulto da Saúde Pública dando seu nome ao Centro Social Urbano da Ilha da Conceição e a uma rua de Piratininga. Benemérito das Associações Médicas Brasileira e Fluminense, Doutor Honoris Causa do Conselho Universitário da UFF, foi homenageado com as mais altas distinções conferidas por exponenciais organismos de diversos países. A Academia Fluminense de Letras o fez Patrono da Cadeira nº 6 de sua Classe de Ciências.

 

       O desaparecimento físico de Marcolino Candau não pode apagar a memória de suas obras – o exemplo de perseverança, a consciência da missão que lhe fora confiada em favor da humanidade.

Waldenir de Bragança

Presidente da SOBRAHSP 2002-2013

 

Referências:

BRAGANÇA, Waldenir. O Brasil na Organização Mundial de Saúde através de Marcolino Candau Ministro da Saúde do Mundo. Niterói: Instituto Vital Brazil, 2008.

Dr. M. G. Candau and W.H.O. British Medical Journal, nº 5.864, 26 maio 1973, p. 433. Londres, Inglaterra: BMJ Publishing Group Ltd / British Medical Association. Disponível em: <https://www.bmj.com/content/2/5864/433>. Acesso em: 10 jun. 2020.

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